A luta é urbana, o caminho esta
ainda sendo construído
O
urbano é agora a escala do mundo. O que esta posto para o debate como produto
da contestação, como momento em que a
luta se impõe como necessidade e desejo (entrando em conflito com a passividade
do cotidiano), numa escala mais ampla, é o "direito
à cidade", como direito à vida urbana em sua plenitude. E só o debate
e a reflexão permitirão pensar os passos seguintes.
O
corpo tomando os espaços construídos para os carros vão revelando os conflitos que
estão na base de nossa sociedade. Algumas questões aparecem no horizonte: a) o voto
na urna tem justificado, que depois de eleito, o político e o partido podem
fazer o que quiserem e como quiserem. Os
partidos políticos fazem alianças sem se preocupar com o que a sociedade pensa,
mas em "nome dela". Um minúsculo exemplo revela o modo como se faz política
no Brasil: o vice-governador de São Paulo é ministro e não vê nenhum problema
nesta atitude, e todos acham normal e pior, acham que é tema para o debate! Seria
irônico se não fosse trágico! O exercício de
nossa democracia precisa ser repensada;
b) as ruas - espaços públicos por excelência, mas pensado como lugar dos
carros - apontam indignação e descontentamento com a vida na metrópole e o modo como
se constrói o espaço urbano separando moradia do trabalho e lazer. A proposta
do "Arco do Futuro" não vai resolver este problema. Os frequentes processo
de valorização do espaço urbano tem afastado os pobres para periferias cada vez mais distantes, situação que o projeto vai aprofundar; c) o transporte
é apenas um dos direitos do cidadão. Ele precisa morar dignamente, ter acesso a
saúde, alimentação. Ele precisa de educação de qualidade e cultura, ao lazer. E
acesso ao centro e a centralidade metropolitana! Diretos de ir e vir, num
transporte coletivo digno e ubíquo na metrópole que garanta, em pouco tempo, o
direito de acesso à vida na metrópole e com horários estendidos. Não se diminui
o preço da passagem de ônibus aumentando o IPTU, mas repensando o orçamento e
suas prioridades, o modo com o ele se constrói
as alianças que privilegiam os setores imobiliários, as empresas de transporte, as grandes construtoras, o modo
como se abrem os cofres públicos criando infraestrutura e incentivos para a
iniciativa privada, sob o discurso de que geram empregos; d) o aprofundamento
da segregação como característica de uma
metrópole que se constitui como negócio passível de ser lida pela valorização advinda da construção de
infraestrutura que abre espaço para novos negócios privados em detrimento dos
moradores dos lugares atingidos, posto que expulsam a "população não
compatível" (para utilizar um termo corrente no planejamento) nas das
áreas renovadas, etc..
A
cidadania não tem por conteúdo a qualidade de vida, nem sem reduz à posse de bens de consumo. As manifestações urbanas, por
excelência, apontam os problemas vividos e, porque urbanas, reúnem uma gama de
situações que iluminam os níveis da realização da vida e da necessidade de
participação, de forma mais ativa, nas decisões. Portanto o direito de ser
ouvido e de participar dos rumos da sociedade como um todo.
Numa sociedade urbana a luta realiza-se
de outra forma e o modo de lidar com ela
é não criminalizá-la nem subestimá-la. Estamos adentrando numa nova forma de
sociedade que exige uma novo modo de diálogo que é o que esta sendo construído,
agora, nas ruas.
Ana Fani Alessandri Carlos