O
debate acadêmico requer responsabilidade e ética.
Estamos
na Universidade de São Paulo, uma instituição pública. Um dos sentidos do
público remonta à Grécia de Péricles: "aquele do bem comum". A perda
deste sentido tem autorizado algumas ações na universidade que precisam ser
pensadas. Junto com o esvaziamento deste sentido da universidade se destitui a
história ( a sua, das contradições vividas, das utopias que envolve
necessariamente um projeto de universidade que orienta a pesquisa, o ensino, das
lutas travadas, das conquistas, etc..).
Daqui
surgem inúmeros desdobramentos. No mundo moderno, por exemplo, as novas mídias,
ao mesmo tempo que permitem a disseminação do conhecimento, se tornaram o lugar
aonde afirmações levianas e a difamação colocam em cheque o trabalho acadêmico,
o papel da universidade, suas conquistas, a capacidade do professor de criar um
curso e de avaliar um aluno. O debate tem se deslocado, com grandes prejuízos, da sala de
aula e dos lugares acadêmcios. O que esta escrito assume foro de verdade
desautorizando todas as contextualizações sem as quais a realidade só tem um
lado e, portanto passível de ser aplainada, esvaziada, quantificada. A vitória
da lógica sobre a dialética!
Meu
compromisso, histórico, é com a formação dos alunos aonde a sala de aula é,
para mim, o lugar do exercício de liberdade de pensar à partir de várias
possibilidades teóricas compreendendo o ato de conhecer como momento crítico e da elaboração da critica. Meu
compromisso, histórico, é com a pesquisa como momento/movimento de
construção de um pensamento capaz de explicitar e compreender a realidade
brasileira como condição de exercício de
independência frente ao conhecimento
produzido "lá fora", sobre nós, e do autocolonialismo que,
infelizmente, graça na universidade brasileira. Meu compromisso histórico, é
com o trabalho preocupado com a interpretação do
mundo que, certamente, não produz sua transformação mas é um passo importante
na desmistificação dos discursos ligeiros, das ideologias, das representações
que permeiam a vida cotidiana no mundo moderno
com seus modelos de felicidade e bem estar. Com isso capaz de abrir
perspectivas reais para a construção de um projeto de transformação da sociedade. Penso que a tarefa acadêmica é
improdutiva por excelência, repousa no tempo lento da reflexão. Seu
comportamento é crítico; seu compromisso
é com a sociedade e não com o mercado. Jamais deixei de aceitar o desafio de pensar
o mundo (em sua totalidade) e nossa condição no mundo através e a partir da Geografia, mesmo sendo uma disciplinar
parcelar.
Entendo a sala de aula como o lugar
dos questionamentos aonde
esta posto o desafio e possibilidade do exercício de liberdade como momento de construção de um pensamento sobre o mundo
em que vivemos, suas contradições e a condição alienante na qual vivemos
submetido ao mundo das imagens, da espetacularização da celebrização. É o
espaço de aprendizado habitado por um
tempo que se quer lento. Marcado pela reflexão e pela descoberta que desfavorece a imitação, o saber “imposto” e
“vomitado” nas provas. Preocupado com a apreensão do movimento real dos fenômenos.
Lugar que requer compromissos de
professores , mas também dos alunos. Penso que o trabalho na universidade
pública contempla uma utopia. “Tudo que ainda não nasceu pode vir a nascer,
desde que não nos contentemos em ser simples órgãos de registro”, como escreve
Artaud é minha inspiração. Para tanto o pensamento necessita, “ter por teto a
vasta liberdade e só pode permanecer no ilimitado"( Victor Hugo).
Esse caminho enquanto possibilidade, foi-me
oferecido no Departamento de Geografia ora como aluna, ora como
professora. No DG penso, se leva às últimas consequências o fato de que a
Geografia se apresenta como uma multiplicidade possível de abordagens em função
de múltiplas visões de mundo e que não há, portanto, uma única possibilidade de
entendimento da Geografia (claro que essa situação não se dá, sem dificuldades
e alguns desconfortos). Essa liberdade nos move e orienta a pesquisa e é um dos
fatores de nossa excelência.
Assim situado, como pensar, entender e analisar, hoje, a metrópole, num
momento em que a sociedade urbana se constitui a partir da generalização do
processo de urbanização do mundo ? Como a centralidade do conceito de
"produção do espaço urbano" permite construir essa compreensão?
Esse caminho se traça no plano da teoria. Colecionar fatos não nos conduz a lugar
algum no que se refere a tentativa de
desvendar os conteúdos reveladores do espaço enquanto espaço produto da
sociedade. Um amontoado de fotos coloridas, de pedaços de textos retirados ao
acaso de livros e teses, de recortes de jornais (como a "instalação
montada na sala de aula do primeiro dia do curso) não se explicitam em si. A realidade não aparece aos nossos olhos como ela é, se
assim fosse, não existiria ciência, alertava Marx - e não é preciso ser
marxista para constatar essa afirmação!! . É cada vez mais atual o alerta de Walter Benjamin
que o gosto pelo mundo das imagens se alimenta "de uma sombria resistência contra o saber“.
Esta escrito no PROGRAMA do
curso de Geografia da Metrópole ( e esta no
blog do curso) desde fevereiro, que teríamos como reflexão inicial as
contribuição do curso de " Geografia urbana", afinal os cursos não
são gavetas estanques! Assim se elaboraram as questões para os estudantes
pesarem: a) existiria uma "Geografia da metrópole" ou uma abordagem
geográfica para a compreensão da metrópole? Quais seriam os planos de análise? b)
no plano da morfologia e da paisagem urbana metropolitana o que seria
específico da metrópole? O que ela condensa ou reúne? Como o cidadão a vê ou percebe, ou descreve-a?c) como a metrópole
aparece na mídia? há diferenças ou convergências? Quais? São reveladoras (do
quê) ou ocultadoras ( do quê)?
Consta
como conteúdo para a 6ª AULA um
debate em grupo cuja tarefa era partindo
dos dois trabalhos realizados no curso, das aulas expositivas e das leituras, refletir sobre: a) quais
questões poderiam ser construídas no sentido de criar um caminho para a
análise da metrópole; b) como estas questões se desdobrariam em temas de abordagem de um curso de Geografia
criando os conteúdos das próximas aulas?
c) elaborar uma hipótese de pesquisa para ser desenvolvida pelo grupo.
Estas seriam apresentadas sob a forma de
uma aula de uma hora - cuja sequência, atendendo a um critério acadêmico, foi
realizada coletivamente, na sala de aula.
Consta
como conteúdo para a 7ª AULA
apresentação e debate das hipóteses elaboradas pelos grupos a partir de uma tarefa
extra classe de pesquisa bibliográfica capaz de apoiar o desenvolvimento dos debates do grupo.
Cada grupo definiria seu tema visando a
compreensão da metrópole do século XXI a
ser apresentada como uma das aulas do curso.
Consta
como conteúdo para a 8ª AULA:
primeira parte da aula - análise e
desenvolvimento , hipótese. Segunda parte - debate sobre a pesquisa apresentada
a partir da leitura individual escolhida pelo grupo.
Consta
ainda no programa do curso entregue nas mãos de cada estudante, no primeiro dia
de aula, (e que esta publicizado no blog do curso) algumas observações, dentre
elas: 1.Os alunos, interessados em seguir o curso podem inicia-lo mesmo sem matrícula formal.2.
a realização deste tipo de curso, aonde
o estudante tem papel ativo preponderante, pede atenção à realização dos
trabalhos individuais e em grupo. O aluno deverá estar em sala de aula, 70%
do tempo total de duração de todas aulas ministradas e a tolerância de atraso
será de no máximo 30 minutos (idem para saídas).
Logo trata-se de um curso compartido
professor e aluno como modo de construção coletiva de uma compreensão da
metrópole - é por isso que cada grupo trabalharia uma hipótese e não uma
abordagem de temas ao acaso. Elencar não é conhecer. Citar autores não garante
qualidade se os autores não forem interpretados corretamente. A linguagem
utilizada deve permitir a explicitação do movimento do pensamento, exprimir os
conteúdos da reflexão. Não é um discurso aonde a ideia se completa por um
interjeição deixando solto o raciocínio.
Há, na proposta do curso, um movimento metodológico
importante: a passagem do seminário ( visto como resumos sobre um ou vários
autores) em direção a realização de uma reflexão
a partir destes autores(escolhidos pelos grupos), guiadas por uma hipótese com
potência para construir uma compreensão sobre a metrópole. Insisto a
proposta do curso se apoia num trabalho
coletivo que tira o aluno do conforto da cadeira para uma participação
efetiva na produção da compreensão da metrópole a partir dos conhecimentos
adquiridos, até o momento, no curso de Geografia.Portanto o curso de Geografia da Metrópole se apoia num projeto
acadêmico. No respeito a formação do aluno. No compromisso com a universidade
pública. Compõem um projeto utópico.
Esta
proposta esta escrita,publicada, repetida exaustivamente, na sala de aula. Só
quem não estava na sala de aula (mas claro, assinou a lista!) quem não leu o programa do curso ( talvez porque se
tratava de um curso apenas para auferir crédito!), pode fazer as observações
sobre o curso, que constam em postagem no facebook e enviados para todos os alunos.
A DIFAMAÇÃO
não substitui o debate acadêmico. Não contribui a formação do estudante.
Desmerece a universidade pública. Torna leviano nosso trabalho. Ignora,
impunemente trajetórias de luta. É despolitasador. É a violência (ocultada e,
porisso mesmo, não percebida) instaurada no trato da relação professor-aluno.
ana fani
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